No momento em que escrevo esta mensagem que acompanha e introduz o relato da nossa actividade em 2021, entrámos na segunda semana da invasão da Ucrânia pelas forças militares da Federação Russa. Esta agressão militar fez regressar o pesadelo da guerra na Europa à medida que o mundo assiste a uma escalada de violência ainda sem fim à vista, também sobre alvos civis.
As severas sanções económicas impostas à Rússia pelo mundo ocidental e grande parte do resto do mundo (incluindo a Austrália e o Japão, por exemplo) multiplicam-se, isolando-a. A suspensão de relações comerciais, a retirada de investimentos, a eliminação de produtos oriundos da Rússia e da Bielorrússia das prateleiras (como fizeram as nossas companhias Biedronka e Hebe, na Polónia), a proibição das companhias aéreas e aviação privada russas de sobrevoarem o espaço europeu e dos EUA, o acto de banir bancos russos da rede de pagamentos SWIFT, são algumas das formas que a reacção de repúdio à actuação da Rússia tem vindo a assumir. Enquanto isso, cresce o número de queixas junto do Tribunal Penal Internacional por parte de 39 nações que pedem investigação de alegados crimes de guerra, contra a humanidade e de genocídio perpetrados pelas forças russas na Ucrânia, designadamente nas cidades de Kiev, Kharkiv e Kherson.
Poucos dias depois do início da agressão, é ainda cedo para perceber a dimensão total das consequências humanitárias e económicas no curto, médio e longo prazos. Mas é já claro que os impactos superarão em muito a escala regional. Neste momento, a prioridade imediata é dar o apoio possível aos refugiados da guerra, que o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados já estimou em mais de 2 milhões de pessoas.
A Polónia, que tem fronteiras com a Ucrânia e com a Rússia, bem como com a Bielorrússia, está, desde o primeiro momento, na linha da frente do acolhimento e do apoio a quem foge à guerra. Até ao momento, e apesar do dinamismo dos números, estima-se que mais de 1,2 milhões refugiados tenham entrado na Polónia e centenas de hospitais foram colocados em alerta por todo ao país, prontos para receber os feridos.
A ligação entre a Polónia e a Ucrânia é muito próxima e a comunidade ucraniana na Polónia antes desta crise já era superior a um milhão de pessoas, que facilmente se integram no mercado de trabalho e no país. A Biedronka, por exemplo, emprega cerca de 1.800 colaboradores ucranianos a quem disponibilizou de imediato mil złoty não reembolsáveis para contribuir para o apoio a familiares.
É nessa afinidade e conhecimento mútuos que mergulham também as raízes da imensa solidariedade que o mundo está a testemunhar por parte da Polónia. Os polacos não poupam esforços para auxiliar os ucranianos, e isso inclui, naturalmente, todas as nossas equipas que estão totalmente mobilizadas para ajudar.
Em poucos dias, a Biedronka e a Fundação Biedronka canalizaram o equivalente a 10 milhões de złoty (acima de 2 milhões de euros) para apoio alimentar e não-alimentar aos refugiados ucranianos, operacionalizado em conjunto com organizações não-governamentais no terreno. A Fundação Biedronka recebeu ainda 2,5 milhões de euros da Sociedade Francisco Manuel dos Santos, o maior accionista de Jerónimo Martins, para apoiar o alojamento de refugiados. Ao nível do Grupo doámos 5 milhões de euros, divididos em partes iguais por cinco instituições polacas de ajuda humanitária: a Cruz Vermelha, a Cáritas, a Acção Humanitária, a Missão Médica e as Aldeias de Crianças SOS.
Em resumo, conseguimos reunir rapidamente o equivalente a cerca de 9,5 milhões de euros para ajudar as pessoas que fogem da guerra.
Também em Portugal, as nossas maiores Companhias – o Pingo Doce e o Recheio – manifestaram-se desde logo disponíveis para participar no esforço colectivo de receber e integrar os refugiados ucranianos que venham para Portugal.
Toda esta situação no Leste da Europa vem acrescentar complexidade e incerteza a um contexto já antes marcado por alguma falta de previsibilidade sobre a recuperação económica, mesmo se durante estes últimos dias a ameaça pandémica ter perdido muita da atenção e dos espaço mediático.
Além disso, a aceleração da inflação que já se vinha a registar desde 2021, nomeadamente ao nível da energia, pode vir a ser agravada pelo conflito militar, a que se somarão expectáveis constrangimentos nos circuitos logísticos.